quarta-feira, 20 de março de 2013

Carl Sagan e o ceticismo 'mágico'!


É interessante como as redes sociais podem unir as pessoas com interesses comuns: após comentar hoje em uma postagem no Facebook de um amigo que acreditava ser ao acaso estarmos todos aqui nesse mundo, acabei conhecendo outro cientista, esse social, que concordou com a minha colocação e me fez a seguinte indagação: “você gosta de Carl Sagan? O Sagan mudou a minha vida!”.

Sempre que escuto essa frase fico emocionada. O mesmo aconteceu comigo: ler os livros do Sagan também mudou a minha vida!

Carl Sagan foi um astro-físico estadunidense (1934-1996) que além de ser exímio cientista, era um divulgador científico encantador! Com a sua forma dócil, não arrogante e simples de explicar, Sagan conseguiu levar o pensamento cético e científico para muitos lares. 



Hoje, li dois textos do Science blogs que me fizeram relembrar a urgência que temos em ter bons cientistas divulgadores: o primeiro deles foi este aqui, publicado no RNAm e intitulado 'Como um doutor em biologia pode ser anti-Darwin?', mostrando o absurdo de como 1 entre 2 estadunidenses não acreditam na evolução das espécies e o quanto isso está relacionado com as informações desencontradas divulgadas pela mídia, além das convicções religiosas. Nas palavras da autora: 

“...Para Chris Mooney e Matthew Nisbet, a polêmica tem raízes religiosas mas grande parte da culpa é da mídia. Eles afirmam em um artigo intitulado “Undoing Darwin” (ou “Desfazendo Darwin”) que quando a evolução sai do campo científico e entra no campo político e jurídico, ela deixa de ser coberta por jornalistas com conhecimento científico para navegar entre páginas sobre política e opinião, e também nos jornais televisivos. Todos esses contextos, cada um ao seu modo, tendem a retirar a ênfase na forte evidência científica em favor da evolução para dar credibilidade à ideia de que há uma crescente controvérsia sobre a ciência evolutiva, e assim a mídia está cumprindo o seu papel e cobrindo “os dois lados” do tópico. Eles afirmam categoricamente que esta prática “pode ser politicamente conveniente, mas é falsa”...


... Algo semelhante acontece com o caso das mudanças climáticas e aquecimento global. Ao tentar veicular ambos os lados do debate de maneira “imparcial”, a mídia retrata de maneira bastante desproporcional a opinião partilhada pela maioria dos cientistas quando dedica o mesmo tempo no ar (ou o mesmo espaço na mídia impressa) para os céticos. Dá nisso, o público fica confuso e a ignorância se espalha feito fogo no milharal...” 

O mesmo tema é discutido por Mauro Rebelo, no seu blog Você que é biólogo (Vqeb) no texto ‘Aproximando os cientistas da sociedade’ onde ele disserta sobre como somos a sociedade humana mais dependente da tecnologia de todos os tempos, mas como, mais do que nunca, não conseguimos dialogar com a ciência. 


“...E assim criamos um paradoxo: as pessoas nunca usaram tanto a ciência (e a tecnologia), nunca foram tão dependentes da ciência e, ao mesmo tempo, nunca estiveram tão distantes dela. É como se os computadores, os tecidos, as viagens, os remédios, as comidas, os livros… como se tudo isso viesse de algo que não foi, em um passado recente, uma ideia de um pesquisador em um laboratório... “ 

Mas não é por falta de interesse que as pessoas deixam de se inteirar sobre o tema:

 “... A última pesquisa de opinião encomendada pelo MCT em 2010 mostra que 65% da população brasileira tem interesse pela ciência (mais que pela política, mas ainda menos que pelo esporte) e que a internet já é a principal fonte de acesso a notícias para jovens e adultos até 30 anos. Só que um alto percentual (40%) da população que não se interessa por ciência, explica que simplesmente não consegue entender do que se trata. ...” 

O que está faltando? Muita coisa, e este texto do Vqeb discute bastante as várias razões. Dentre elas, uma questão relevante é: está faltando divulgação científica bem feita! E isso Sagan sabia fazer muito bem!! Você gosta de ciência? Leia “O Mundo Assombrado pelo demônios”! Você vai entrar numa viagem intergaláctica sensacional! E sabe o que é melhor? Não vai ser ficção científica! Porque, como nas palavras de Sagan, “não é possível voarmos de avião e ao mesmo tempo termos certeza que os sagitarianos são gregários e afáveis”.

Sou apaixonada por ciência e ceticismo há alguns anos. Esta paixão mudou minha visão sobre a vida. Minha visão de mundo. O ceticismo te desampara daquela certeza cômoda de que existe alguém guiando todos os seus passos. Mas ao mesmo tempo, coloca nas suas próprias mãos (ou nos seus próprios pés) a responsabilidade pelo caminhar. E pela direção. Não tome isso como desamparo: tome isso como liberdade!










quinta-feira, 7 de março de 2013

Mais do que uma estátua

"... eu sou feliz e rodo pelo mundo.
Sou correria mas também sou vagabundo.
Mas hoje dou valor de verdade: pra minha saúde,
 pra minha liberdade.." (Chorão)

Será?

Ontem morreu Chorão, vocalista da banda Charlie Brown Jr, aos 42 anos de idade, aparentemente devido ao abuso de drogas e remédios tranquilizantes controlados. Como a imprensa oficial adora se beneficiar de tragédias para desvirtuar a atenção de assuntos mais relevantes, muitas reportagens saíram comentando a vida do músico, sua obra, seu legado.

Meu tempo de ouvir CBJr já passou há muito tempo, mas entendo que este seja o momento de se falar sobre o que foi a vida dele: os fãs querem ouvir, querem fazer uma retrospectiva da história do cantor, querem prestar homenagens. Li até mesmo que um músico, amigo de Chorão, sugeriu construir uma estátua em sua homenagem na cidade de Santos, por conta dos projetos sociais que o cantor mantinha lá, a maior parte deles ligado ao incentivo à prática do skate. Tudo bem. Faz parte. Ele se foi, que se prestem as homenagens! Mas há algo nessa história toda que não está sendo dito, e que deixa essa blogueira preocupada:

Também no ano retrasado morreu precocemente, aos 27 anos, a cantora Amy Wine House. Com um futuro brilhante pela frente, a música perdeu uma roqueira espetacular também para o abuso de drogas e remédios controlados. As reportagens que se sucederam a sua morte seguiram a mesma linha das reportagens póstumas a Chorão.

A partir desses dois exemplos, não fica claro e cristalino que a precocidade dessas duas mortes - e de muitas outras por aí, de pessoas não famosas – precisa ser discutida? Por que eles morreram assim tão jovens?

Melancholisches - de Heinrich Hoerle (1895 - 1936)


Em entrevista, o motorista de Chorão afirmou: “... ele não me parecia doente, não. Só gostava de não ser incomodado e dormia por longos períodos...“. Além disso, a separação do cantor de sua esposa está sendo tratada como uma das causas que levaram à tragédia ocorrida no dia de ontem.

Está na hora de aprendermos a identificar os sintomas decorrentes das doenças psíquicas. Apatia, tristeza e desânimo momentâneos fazem parte de vida e ninguém está imune e nem deve tentar evitar essas situações. Sofremos desapontamentos o tempo todo. ‘Encher a cara’ com os amigos, beijar outras bocas, ‘pagar um micão’ também são rituais de passagem saudáveis. Servem mais ou menos como o velório: o ser humano precisa de um ‘closure’, precisa entender que aquela etapa terminou, e é preciso partir para a próxima. E por isso, usa o ritual.

Mas devemos ter em mente que ninguém morre de amor. Quando certos sentimentos passam a dominar a vida da pessoa – ansiedade e medo exagerados, por exemplo – é muito provável que ela esteja doente. Doenças psiquiátricas caracterizam-se como doença tanto quanto qualquer outra doença física que conhecemos melhor, como câncer, úlcera e etc. E elas precisam ser tratadas clinicamente. Na maior parte dos casos, não é apenas a força de vontade que vai fazer a pessoa sair da fossa; ela tem uma deficiência bioquímica que precisa ser tratada com medicação! Muitas vezes só exercício físico, uma mudança de atitude e de alimentação já resolvem! Mas é preciso que se acompanhe o paciente de perto! 

Dessa forma, sono em excesso, falta de apetite, desânimo prolongado, abuso excessivo de tranquilizantes são sinais para os quais devemos ficar atentos! Várias doenças psiquiátricas – depressão, distúrbio psicótico, esquizofrenia – já foram caracterizados clinicamente, e a internet está cheia de informações para quem quiser se inteirar mais sobre elas (mas por favor, verifique a fonte da informação primeiro!).

Escrevo sobre isso hoje por ter ficado chateada de ver novamente mais um jovem morrendo tão precocemente. A vida é tão legal e cheia de alternativas! E tenho certeza que o músico inspirador deste post, ainda tinha muita vontade de viver, escrever mais músicas e zoar por aí. Ainda, não estou dizendo que o Chorão não foi avisado, ou que as pessoas próximas dele não tentaram ajudar. Com experiências pessoais intensas e dolorosas, tendo eu um paciente psiquiátrico com uma doença séria na família, afirmo que sei o quanto é difícil ajudar alguém nessa situação. Mas muitas dessas pessoas só precisam de um empurrãozinho amigo para ir em busca de uma vida melhor.

Adianta discutir isso agora que ele já morreu? Adianta. Mais do que construir estátuas, é necessário que se observe de perto em vida as pessoas que amamos e que convivem conosco. Quem sabe a partir disso, vai ser possível conseguir evitar que amanhã seja o seu amigo ou a sua namorada a morrer assim sem razão. Ou quem sabe a sua mãe.