domingo, 7 de dezembro de 2014

Histórias Cruzadas

Ontem a noite assisti um filme muito bonito e intenso, embora seja uma pena que a arte tenha que contar histórias tristes como as do filme Histórias Cruzadas (The Help). 


O filme narra a história de algumas empregadas domésticas na década de 1960, em um dos estados mais preconceituosos dos Estados Unidos na época, o Mississipi.

Não sei se durante a minha navegação pelo Netflix, fui induzida a escolher esse filme por causa do livro que estou lendo, chamado 'Eternidade Por Um Fio', o último livro da trilogia 'O Século' de Ken Follet, que conta, em forma de romance, alguns dos eventos políticos mais importantes do século XX. Esse último livro fala muito sobre a luta pelos direitos civis nos Estados Unidos da década de 1960, e dos assassinatos de John F. Kennedy (em 1963) e Martin Luther King (1968) por opositores racistas. Quando olhamos em retrospectiva para esses eventos históricos, geralmente acabamos concluindo: que absurdo! Os assassinatos, o separatismo entre brancos e negros da década de 1960, a violência contra os negros.

Eu também acho um absurdo. E uma das coisas que mais me orgulho é de trabalhar no campo da genômica, e poder falar de boca cheia que a ciência já mostrou que a partir dos nossos genomas, não podemos ser separados por raças: que somos todos potencialmente iguais. (Já escrevi mais de uma vez sobre isso, aqui e aqui.)

Mas a reflexão que gostaria de trazer aqui vai além do absurdo.

Quem me conhece sabe que sou bastante interessada pela história do século XX. Embora esse século tenha sido marcado por muito sofrimento, ele também foi marcado por muita superação, por mudanças, como a emancipação e revolução feminina que começou na década de 1920 com a Primeira Guerra Mundial. E é isso que me fascina na história desse século.

Mas sempre que eu reflito sobre esses momentos de sofrimento e mudança do século XX, fico pensando no tipo de pessoa que eu seria se tivesse vivido em algum desses momentos cruciais. Novamente: olhando em retrospectiva, é muito fácil considerarmos um absurdo a ausência do voto feminino, ou a separação de banheiros entre negros e brancos, o extermínio de pessoas de acordo com sua etnia ou religião. Mas e se tivéssemos vivido aquele momento, quem nós seríamos? Como nós agiríamos?

Gosto sempre de pensar que eu seria tão forte quanto àquela primeira mulher que saiu na rua usando uma calça jeans, ou a primeira mãe solteira. Ou o primeiro grupo de homossexuais que decidiu lutar pelos seus direitos. 

Mas, se tem algo de concretos que podemos saber nessa vida, é que os "se" não existem. O que eu teria sido se tivesse nascido em qualquer outro momento histórico eu não tenho como saber.

Mas tem uma coisa que eu sei: que nesse momento presente eu tenho a potencialidade para ser qualquer pessoa que eu escolher ser. 

Não deixemos que os grandes absurdos já superados do passado, camuflem os absurdos do momento presente: a desigualdade da distribuição de renda e recursos, o trabalho escravo ainda existente, a desigualdade de gênero massacrante camuflada na frase já foi muito pior, o racismo e a homofobia. A utilização dos recursos naturais de forma insustentável. 

E aí, 

Quem temos escolhido ser?

Juro que eu não tenho nem a resposta nem qualquer fórmula perfeita. Muito pelo contrário. Só quis trazer à tona a pulga que ficou atrás da minha orelha...